
Foto: Divulgação INPA
Peixes da Amazônia podem estar sendo intoxicados por substâncias encontradas em tintas usadas em cascos de embarcações comerciais que cruzam uma das maiores redes de rios de água doce do mundo.
A conclusão é do Laboratório de Ecofisiologia e Evolução Molecular (Leem), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus. Nos últimos cinco anos, os pesquisadores observaram que a presença de nanopartículas de cobre, encontrada em abundância nas tintas das embarcações, causa danos no aparelho respiratório de peixes como o cará-anão e cardinal.
“Esse tipo específico de produto impede que diferentes organismos possam aderir ao casco das embarcações. No entanto, essa tinta libera cobre continuamente para o ambiente e causa impacto nos sistemas fisiológicos e bioquímicos dos animais”, explica Susana Braz-Mota, que também é bióloga e conduziu as primeiras pesquisas ainda em 2015. Resultado completo das observações foi publicado na Science of The Total Environment, na última semana. Artigo também é assinado pelos biólogos do Inpa, Vera Almeida-Val e Adalberto Luís Val.
O cobre expelido pelas tintas ao logo do tempo adere às brânquias, órgão respiratório dos peixes, também conhecido como guelras, modificando as estruturas e, em longo prazo, dificultando a respiração. A brânquia é o órgão de respiração em peixes e tem, portanto, funções que se assemelham ao pulmão dos mamíferos. É nessas estruturas que ocorrem as trocas gasosas entre o sangue desses animais e a água, é também nesse momento que há interrupção de fluxos respiratórios causados pelo cobre.
“O dano às brânquias afeta toda a estrutura de modelagem respiratória, o que tem como consequência alterações na fisiologia do peixe. Isso foi notado em análises histológicas, que mostraram que os animais expostos tiveram o aparelho respiratório danificado”, explica Braz a jornalista Izabel Santos, do Inpa.
Além de problemas no aparelho respiratório dos peixes foi possível detectar efeitos secundários como o aumento de radicais livres e alterações na capacidade de manter os sais internos nos organismos. Cenário cria oportunidade para células cancerígenas se propagarem com maior facilidade nos animais.
“Tudo isso pode afetar a capacidade de reprodução e locomoção dos animais. Suspeita-se que, em longo prazo, dependendo do tempo de exposição e da capacidade desses animais em lidar com essas substâncias tóxicas, esses danos podem impactar até na quantidade populacional desses animais, reduzindo o número de indivíduos de algumas espécies”, alerta Braz-Mota.