
Legenda: Ricardo Abramovay durante lançamento da Casa Ninja Amazônia. Cobertura Ninja Ambiental
Somente a economia da natureza pode salvar a Amazônia do desmatamento, aponta o sociólogo Ricardo Abramovay, professor Sênior do Programa de Ciência Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo.
Autor do livro, ‘Amazônia: Por uma Economia do Conhecimento da Natureza”, o especialista defende que somente um modelo econômico que coloque a sustentabilidade, a valorização da cultura material e imaterial dos povos e comunidades tradicionais, bem como a garantia de proteção nas fronteiras de áreas protegidas, como caminho real para frear o acelerado desmate de floresta nativa. Desde 1970 até 2019, mais de 20% da Amazônia já foi derrubada para dar lugar a pasto e garimpo.
“Nosso grande desafio é a passagem de uma economia da destruição em direção a uma economia de conhecimento da natureza”, afirmou Abramovay durante a mesa: ‘S.O.S Amazônia: Ameaças, ataques e soluções’, ocorrida no último sábado (6), no segundo dia de programação do lançamento Casa NINJA Amazônia, o centro de mídia online em defesa da Amazônia.
Para o especialista, a alteração do atual modelo de exportação de commodities para um modelo sustentável esbarra em três grandes preconceitos. O primeiro é a ideia de que sem desmatamento a Amazônia é incapaz de crescer economicamente, como vem sendo defendido por grande parte do setor ruralista.
“A impressão que as pessoas tem da floresta é que se trata de uma área intocada. Isso não é verdade. Primeiro que o Brasil deveria se orgulhar pelo patrimônio que existe na Amazônia”, diz Abramovay.
O potencial econômico em uma rede de preservação permanente da floresta começa a ser cada vez mais uma necessidade de atuação de governos locais, dado o resultado desastrado da prática do desmate para geração de empregos, por exemplo. “Alguns governadores estão se dando conta que compactuar com o desmatamento é compactuar com uma economia que não gera postos (de trabalho)”.
De fato, em uma velocidade crescente, de alguma forma, governadores da Amazônia tem articulado novos eixos de atuação econômica a partir da realidade local, mas que ainda tem pouca ou nenhuma efetividade.
O Fórum Permanente de Governadores da Amazônia Legal, por exemplo, criado em 2000, tem a missão de formar uma base política para geração de propostas sustentáveis, apesar de pouco resultado efetivo até o momento.
Outra falácia listada por Abramovay sobre modelo de economia para a Amazônia tem a ver com a renda dos trabalhadores que são assediados para a prática de crimes ambientais.
O discurso de setores ruralistas é o de que, como tem muita gente que vive com atividades ilegais do desmatamento, é prejudicial acabar com ele porque tem muita gente pobre envolvida no processo. “Isso é uma falácia”, alerta Abramovay.
Ele explica que boa parte do desmatamento na verdade é feito a partir de empreendimentos poderosos e caros, e que de humilde e pobre não tem nada. “Um dos setores que mais cresceu ano passado foi o de trator de esteiras, que são enviados para Amazônia e nela promovem o desmatamento. O desmatamento é algo planejado”.
Uma reportagem da repórter Brasil listou, inclusive, bancos que financiam grandes empreendimentos que derrubam floresta de áreas protegidas.
‘Só o Brasil protege as florestas’
O especialista rechaça a ideia de que só o Brasil protege as suas florestas. Como exemplo, ele cita reflorestamento em massa que ocorre na Europa e na China, principalmente. As duas regiões impactam diretamente as emissões de gás responsável pelo efeito estufa, e vem aumentando suas políticas de áreas protegidas de florestas.
“A nossa grande questão, a mais importante, é criar áreas protegidas e garantir a proteção delas, algo que o governo não faz, além da repressão ao desmatamento, essas duas coisas são fundamentais para garantir a floresta em pé, mas ainda são insuficientes”, expõe.
Uma preocupação maior em construir junto com a sabedoria popular o fortalecimento de cadeias produtivas de base florestal, promovendo a consequente geração de renda de comunidades tradicionais, passa a ser o principal desafio desse novo modelo econômico.
“Nós precisamos, mais do que nunca, batalhar pela emergência de uma economia de valorização da biodiversidade que só pode surgir caso se apoie o conhecimento tradicional junto com o científico e, também, em empreendimentos ligados às empresas que estejam interessadas em inovação tecnológica para o desenvolvimento sustentável.
A base pra gente permitir e propiciar a emergência de uma economia voltada a biodiversidade, é que seja transmitida a mensagem que a destruição tem que ser interrompida imediatamente e que existem sim, oportunidades interessantes ligadas a economia da natureza”, finaliza Abramovay.