A valorização do ouro durante a pandemia e o lobby pró-garimpo do Governo Federal ajudaram a catapultar o número de pedidos de autorização para garimpo no Amazonas. Em comparação com a média dos dez anos anteriores, as requisições para atividades de lavra garimpeira dispararam 342% em 2020.
Os quase 3 mil processos ativos atingem 120,8 mil quilômetros quadrados, o equivalente a 8% do território amazonense ou a quase 10 vezes a cidade de São Paulo. Eles tramitam em diferentes fases na Agência Nacional de Mineração (ANM), desde o requerimento até a concessão de lavra.
De acordo com dados da agência obtidos em junho de 2021 no Sistema de Informações Geográficas da Mineração (SIGMINE), incidem sobre o estado do Amazonas 2857 processos minerários referentes a 69 substâncias distintas, com o ouro, em primeiro lugar (34% do total da área sob interesse minerário no Estado).
Essas informações constam em relatório elaborado pela OPAN em parceria com o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB). O estudo foi realizado a partir da sistematização dos processos minerários ativos na Agência Nacional de Mineração (ANM) incidentes no estado do Amazonas.
Os dados utilizados foram obtidos em junho de 2021 no Sistema de Informações Geográficas da Mineração (SIGMINE), banco de dados mantido pela ANM, e se referem a processos em diferentes fases de tramitação.
Segundo a OPAN, o relatório foi idealizado para ampliar o conhecimento público acerca do interesse minerário no Amazonas e contribuir com povos indígenas, comunidades tradicionais, suas organizações representativas e parceiras na defesa de seus direitos e na efetiva participação nos assuntos que possam afetar seus modos de vida.
Pois vale ressaltar, a tramitação de milhares de processos minerários no Amazonas ocorre sem que povos indígenas e comunidades tradicionais sejam minimamente informados, a despeito do direito de Consulta Livre, Prévia e Informada garantido a estas populações a partir da ratificação pelo Estado brasileiro da Convenção 169/OIT.
Política ambiental de retrocesso
A questão política pesa muito sobre essa realidade. “Dias após o Ministério da Economia defender a extinção de análise técnica ambiental para a realização do licenciamento de atividades minerárias consideradas estratégicas, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, passou a ser investigado pelo Ministério Público Federal por utilizar a infraestrutura logística de combate à crimes ambientais para promover encontros com grupos pró-garimpo em terras indígenas”, diz trecho do relatório.
“Soma-se a isso o discurso anti-indígena e as recorrentes manifestações do presidente Jair Bolsonaro a favor da expansão da mineração na Amazônia, que impulsionam o avanço do garimpo e outros crimes ambientais para dentro dos limites de terras indígenas e unidades de conservação10. A aprovação do PL 191/2020, de autoria do Poder Executivo Federal, também é aguardada pelo setor ligado ao garimpo”.
O projeto de lei visa autorizar o desenvolvimento do garimpo em terras indígenas, além de regulamentar outras atividades econômicas potencialmente poluidoras.
Concentração de processos
Os dados relacionados aos processos de lavra garimpeira também mostram uma grande concentração de processos minerários sob a titularidade de poucos requerentes: mais de 90% de toda a área requerida em processos de garimpo de minério de ouro no Amazonas estão sob a titularidade de apenas 10 cooperativas de garimpeiros.
Para burlar regras que limitam em até 10 mil hectares a área máxima de lavras garimpeiras, cooperativas aproveitam o contexto político de permissibilidade para enquadrar requerimentos minerários de dimensões industriais como garimpo artesanal e de baixo impacto ambiental. Foram identificadas áreas que ultrapassam 288 mil hectares requeridas por apenas uma cooperativa de garimpeiros em uma única sub bacia hidrográfica.
Outros pontos abordados no relatório
- Existem 168 processos Lavras Garimpeiras ou Requerimentos de Lavra Garimpeira em tramitação na ANM sobrepostos a 601.342 hectares de Áreas Protegidas no estado do Amazonas.
- O setor garimpeiro busca explorar 1.602 hectares sobrepostos a terras indígenas, 2.931 hectares sobrepostos a Unidades de Conservação de proteção integral e 13.797 hectares em sobreposição a Reservas Extrativistas, áreas onde as atividades minerárias são impedidas por lei.
- O entorno das terras indígenas também é alvo de interesse minerário. Foram identificados 100 processos de garimpo localizados a menos de 10 km de terras indígenas no Amazonas.
- Ainda que o Ministérios Público Federal argumente que atividades minerárias em outras modalidades de Unidades de Conservação de uso sustentável possam ser realizadas apenas excepcionalmente, desde que expressamente previstas no Plano de Manejo da Unidade, tais Áreas Protegidas tem 583.012 hectares de seus territórios pleiteados em processos de garimpo. O levantamento de informações 4 indica que apenas 02 das 19 Unidades de Conservação alvo destes processos autoriza expressamente em seu Plano de Manejo a realização de atividades minerárias.