Ministro determinou abertura de investigação para apurar omissão e genocídio pelo governo Jair Bolsonaro
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), determinou que a Polícia Federal abra investigações em Roraima para apurar a situação que levou à morte de mais de 500 crianças indígenas do povo Yanomami, no estado de Roraima. De acordo com o ministro, existe indício de genocídio contra o povo.
As linhas de investigação serão pelos crimes de: genocídio, omissão de socorro, peculato, desvio de verba pública e crime contra o meio ambiente.
Para Dino, há suspeita de que os recursos públicos que eram destinados para saúde indígena não estariam sendo empregados corretamente na região amazônica.
“A Polícia Federal vai atuar nesta apuração a partir dessa semana porque é óbvio que nós precisamos de uma resposta enfática à gravidade dessa situação posta no território brasileiro”, disse Flávio Dino, em citação do UOL.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) declara que a situação do povo Yanomami foi levada à Justiça pelo menos 21 vezes. Segundo a entidade, 100 crianças morreram em 2022, como publicou a Mídia NINJA.
Reportagem publicada na sexta-feira pela plataforma Sumaúma com base em dados exclusivos revelou que o número de mortes de crianças com menos de 5 anos por causas evitáveis na Terra Yanomami aumentou 29%. Foram 570 pequenos indígenas mortos nos últimos quatro anos por doenças que têm tratamento.
Omissão
Procuradores do Ministério Público Federal (MPF) afirmam que a situação de saúde dos Yanomami foi causada pela omissão do Estado brasileiro na proteção das terras indígenas. A conclusão está em uma nota publica divulgada pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF. De acordo com a nota, apesar dos esforços feitos pelo órgão, as providências tomadas pelo governo Bolsonaro foram limitadas.
A nota cita uma série de iniciativas do MPF para monitorar, alertar e cobrar das autoridades responsáveis providências em relação à expansão do garimpo ilegal e à precariedade dos serviços de saúde prestados ao povo Yanomami nos últimos anos. Destaca também o compromisso da instituição de continuar atuando para coibir as atividades ilegais de garimpo e outros ilícitos em terras indígenas para a retirada de invasores nas Terras Indígenas Yanomami e de outros povos, bem como para o fortalecimento da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).
Apagão de dados sob Bolsonaro ocultou crise Yanomami
Há anos tentando chamar a atenção para a crise humanitária causada pelo garimpo na Terra Indígena (TI) Yanomami, as lideranças tinham dificuldade em precisar o número de mortes devido à atividade ilegal, como revela a jornalista Nádia Pontes, no Deutsche Welle.
“Os yanomami foram muito afetados pela desassistência, falta de medicamentos e invasões. A situação é caótica”, disse à DW Brasil Junior Yanomami, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Yek’wana (Condisi-YY) que percorre comunidades do vasto território com equipes dos ministérios.
A crise humanitária não era desconhecida do governo federal. Durante a gestão de Jair Bolsonaro, lideranças indígenas como Dario Kopenawa Yanomami, da Hutukara Associação Yanomami, foram até Brasília expor a situação e pedir a expulsão dos garimpeiros.
“Eles falavam há tempos sobre o cenário, mas não tinham os dados exatos. O acesso a essas informações estava difícil durante o governo Bolsonaro”, afirma Priscilla Oliveira, pesquisadora e ativista da Survival International.
A Hutukara estima que atualmente mais de 20 mil invasores estejam no território revirando o fundo dos rios e florestas em busca de ouro. Esse levantamento feito pelos indígenas era tratado como “exagerado” pelo governo Bolsonaro, como afirmou o então vice-presidente, Hamilton Mourão, durante uma conversa com jornalistas estrangeiros da qual a DW participou.
“A atuação dos garimpeiros não causa só impacto ambiental, de desmatamento, de revirar solo. Há problemas de contaminação de rio com mercúrio, dos peixes, da água usada de diversas formas pelos indígenas. A presença dos garimpeiros espalha malárias, covid e outras doenças”, explica a ativista da Survival International.
Só em 2022 foram registrados 11.530 casos de malária no Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami, distribuídos entre 37 polos. O destaque foi para os casos na faixa etária de maiores de 50 anos, seguida pela dos 18 a 49 anos, e a dos cinco aos 11 anos de idade.
Numa carta enviada ao presidente Lula em dezembro de 2022, mulheres Yanomami narraram os conflitos e a violência que vivenciam dentro do território demarcado para uso exclusivo do povo indígena.
“Os rastros de garimpeiros fazem crescer a malária. Antes, quando não tinha tantos garimpeiros, as doenças eram poucas. Em algumas regiões do território Yanomami, nossas crianças estão morrendo por malária, desnutrição, pneumonia e até por infestação de vermes.”
Segundo as mulheres, quando buscam ajuda médica nos postos de saúde, recebem como resposta lamentos sobre a falta de remédios, que nunca chegavam, mesmo com a insistência junto às autoridades.
“Essa malária é muito forte e não tem medicamentos para tratá-la. O governo de Bolsonaro acabou com o estoque de cloroquina do Brasil e agora nós sofremos pela sua má gestão. Não queremos ficar chorando porque as pessoas morrem, não queremos ficar chorando até a madrugada. Já temos muitas cinzas mortuárias”, relata o documento.
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