Pressão sobre caso de abuso e morte de crianças forçou PF a realizar coletiva de imprensa (PF)

 

A Polícia Federal, em coletiva nesta sexta-feira (6) disse que a denúncia sobre a morte da menina de 12 anos da comunidade de Aracaçá e de uma criança de 4 anos, que teria morrido afogada, são fruto de um mal-entendido. O delegado do caso, Daniel Ramos disse que se trata de “uma sequência de falas e narrativas que chegaram a criar uma situação concreta”.

Segundo a PF, a “natureza da denúncia não condiz com os fatos concretos e reais”. Mas que ainda não concluiu as investigações e que a coletiva foi realizada por conta do “caráter excepcional e atenção ao interesse que o tema despertou perante a sociedade”. Cinzas foram coletadas na comunidade a fim de detectar a presença de algum material orgânico ou biológico e o resultado do laudo sai em 30 dias. A análise visa esclarecer a hipótese de ter havido a cremação de um corpo no local. Ainda não há clareza de informações sobre o motivo da comunidade ter sido queimada.

Na coletiva, a PF afirmou que a principal linha de investigação, é que as denúncias são fruto de uma sequência de narrativas desencontradas. “Posso assegurar que a investigação segue para que esse fato não ocorreu”, disse o delegado Daniel Ramos à imprensa.

Com base em entrevistas, a PF chegou à conclusão que um servidor da Funai teria visto um vídeo sobre o relatório da Hutukara Associação Yanomami (HAY) – que denuncia casos de abuso e estupro de mulheres na TI Yanomami – e uma liderança que estava presente à mesma ocasião, teria dito que esperava que isso não acontecesse em Aracaçá.

E então, um segundo indígena teria ouvido a conversa e entendido que isso havia ocorrido em Aracaçá e acionando o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye´kwana (Condisi-YY), Júnior Hekurari na sequência. Este, por sua vez, levou o caso a público. Ainda segundo a denúncia, a mãe da criança – e tia da menina de 12 – também teria sido vítima de violência sexual durante a mesma ação criminosa de garimpeiros.

De acordo com a PF, sobre o sumiço de 24 moradores da comunidade, chegou à conclusão que ao menos nove Yanomami residiam no local, “sendo que seis deles foram contatados presencialmente no primeiro dia das diligências no local e outros três – uma mulher e dois netos – estão em Boa Vista para tratamento de saúde da mulher”.

E ainda, que os outros indígenas que residiam no local teriam se mudado para outra comunidade, informação, que segundo a PF, teria sido relatada por Júnior Hekurari nos últimos dias, quando este disse que moradores haviam sido localizados em outras áreas da TI Yanomami.

“Todos os indígenas residentes na comunidade Arakaça foram entrevistados no primeiro dia da ação policial, ocasião em que a Polícia Federal destruiu infraestrutura de suporte ao garimpo ilegal na região, com a queima de mais de 17 mil litros de combustível, barracos e outros bens. A aldeia foi visitada no segundo dia de ação e se encontrava na mesma condição em que fora vista em sobrevoo no dia anterior, não estando em chamas”, diz a PF.

Entenda

No dia 25 de abril, Júnior Hekurari divulgou um vídeo relatando as denúncias que havia recebido e na sequência encaminhou ofício às autoridades competentes.

Em busca de mais informações e do corpo da adolescente, que passaria por autópsia em Boa Vista (RR), Júnior acompanhou agentes da PF e representantes do MPF e Funai que foram investigar o caso. Mas a comunidade havia sido queimada e não havia nenhum dos 24 moradores, como contou Júnior com exclusividade à Mídia Ninja.

Depois do retorno do grupo a Boa Vista (RR), a PF disse que não havia encontrado indícios de crime. Júnior contestou em nota, dizendo que lideranças analisaram as imagens e disseram que quando a comunidade perde um ente querido, ela é queimada e abandonada e eles então, procuram um novo local para viver. Ou seja, era hipótese que depois do crime ter ocorrido, os indígenas haviam deixado o local.

A ausência de informações sobre a comunidade levantou a tag #CadêosYanomami nas redes sociais. Ativistas e defensores das causas cobravam atuação do poder público na apuração das denúncias. Já na quinta-feira (5), Júnior relatou que os indígenas haviam sido localizados em outras regiões da TI Yanomami.

Hutukara cobra rigor nas investigações

Após o anúncio da PF, a Hutukara Associação Yanomami se pronunciou dizendo que ainda apura as informações sobre as denúncias dos crimes contra a menina e criança na comunidade, mas afirmou que tem informações sobre casos de violência contra indígenas em Aracaçá, como homicídio, aliciamentos e abusos sexuais por garimpeiros, ocorre com frequência. E pediu rigor nas investigações dessas denúncias.

A Comissão de Direitos Humanos do Senado deve viajar na próxima semana a Roraima e a Câmara dos Deputados também aprovou a criação de uma comissão externa para apurar as denúncias.

Após a coletiva de imprensa da PF, o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Condisi-YY), Júnior Hekurari Yanomami, diz que aguarda as investigações do caso, pois teria recebido informações de fontes confiáveis e de lideranças indígenas.

“Essa informação eu recebi de uma liderança indígena de confiança da comunidade e também conversei com outras comunidades sobre essas informações. Passaram que sabiam desse acontecimento [estupro e morte de menina] na comunidade de Aracaçá. Por isso, eu fiz o vídeo e o documento relatando”, disse ele.