Foto: Benjamin Mast

Famílias de migrantes venezuelanos em Boa Vista, Roraima, estão sendo ameaçadas agora mesmo de despejo por parte de militares da Operação Acolhida, força tarefa dirigida pelo Exército Brasileiro, e responsável por gerir abrigos em ao menos cinco capitais da Amazônia que recebem refugiados. A comunidade Ka’ubanoko, última ocupação autônoma na capital roraimense, possui até o dia 28 de novembro para abandonar um clube de lazer que está sendo ocupado por cerca de 900 pessoas.

“Quando chegamos aqui, este local, apesar de ser um espaço público, estava totalmente abandonado e servia de esconderijo para pessoas e grupos vinculados a temas de droga e delinquência. Nós ocupamos o lugar pacificamente, fizemos uma limpeza de todo o ambiente e o tornamos lar para nossas famílias, recuperando a função pública que este local tinha perdido, o que foi reconhecido pela vizinhança”, diz o grupo em uma carta pública divulgada nesta terça-feira (23).

As famílias que formam o Ka’ubanoko vivem há quase dois anos no espaço que abrigava o antigo Clube dos trabalhadores, abandonado há anos em bairro periférico da cidade. Os comunitários formam uma organização inter-étnica e se recusam em deixar o espaço sem uma consulta livre, prévia e informada.

“Em consenso acreditamos que um espaço como esse é bem melhor que um abrigo, pois todos nos sentimos livres para as tomadas de decisões, para criar normas que norteiam nossa vida; normas essas que são assumidas, respeitadas e vividas por todos, somos uma comunidade”, completam na carta.

A comunidade reúne um grupo de indígenas Warao, Eñepa, Pemon e Cariñas, e também não indígenas e criollos. Yidtri Torrealba, uma das principais líderes da comunidade explica que é possível chegar ao diálogo com as autoridades locais para que impeçam o despejo.

“Sentimos de verdade praticamente atropelados e ameaçados. Queremos chegar ao diálogo com essas pessoas. Muitas famílias não querem ir para abrigos e se interiorizarem”, explica.

Em Boa Vista, cerca de 13 abrigos para refugiados venezuelanos estão em funcionamento. Fontes ouvidas pela reportagem apontam que existe pressão por parte dos militares para que os migrantes abandonem a autogestão, considerada um empecilho diante das regras impostas em abrigos pelas operações.

Em nota, a Operação Acolhida afirma que todas as possíveis ações de transferência de refugiados estão suspensas até o fim do decreto presidencial que declarou estado de pandemia no Brasil. A operação não quis comentar as denúncias de ameaças de despejo da comunidade.

“Nós, como população de Ka’ubanoko, apelamos ao diálogo, gostaríamos de solicitar nossa permanência, ainda que temporária, neste local, por entender que o contexto de pandemia não é apropriado para um deslocamento em massa”, finaliza a comunidade em carta aberta.

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