O Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles incluiu as Reservas Extrativistas (Resex) no seu polêmico programa Adote um Parque, que coloca a dispor do capital privado as Unidades de Conservação (UC) brasileiras por R$ 50 ou € 10 por hectare ao ano, com o “objetivo de custear a conservação dos parques nacionais”. O Conselho Nacional das Populações Extrativistas, o CNS, enviou carta exigindo a exclusão das Resex, que estas protegem as comunidades que fazem uso tradicional dos recursos naturais e atuam na proteção ambiental destas áreas, evitando invasões e desmatamento.
Confira a carta
O Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS quer a exclusão das Reservas Extrativistas do Programa Adote um Parque em execução pelo Ministério do Meio Ambiente por desrespeitar a legislação e descaracterizar os objetivos para os quais foram criadas.
As Reservas Extrativistas (Resex) foram formuladas em 1985 pelos seringueiros da Amazônia, sob a liderança de Chico Mendes, visando a conciliação entre os direitos fundiários sobre os territórios onde vivem por gerações e os recursos naturais dos quais sempre dependeram para a própria subsistência.
Desde 1990 as Reservas Extrativistas vêm sendo criadas e administradas de forma conjunta entre os órgãos ambientais e associações comunitárias mediante contrato de concessão de direito real de uso celebrado com a Administração Pública.
As Reservas Extrativistas foram incorporadas o Sistema Nacional das Unidades de Conservação (SNUC) em 2000 que definiu como órgão gestor um Conselho Deliberativo presidido pelo ICMBio e que congrega associações de moradores,
organizações não governamentais, órgãos públicos locais e é responsável pela aprovação do Plano de Manejo da unidade de conservação.
As críticas do CNS à inclusão das Reservas Extrativistas no Programa Adote um Parque fundamentam-se nos objetivos para os quais foram criadas e na legislação vigente:
1. Resex e Parques são categorias diferentes de unidades de conservação. Os Parques protegem a natureza e podem ser adotados por empresas privadas. As Resex protegem as comunidades que, pela forma tradicional de uso dos recursos
naturais asseguram também a proteção a natureza, evitam o desmatamento e as invasões, prestando um serviço ao país.
2. Não há, nos Contratos de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRUs) celebrados com as associações constituídas pelas populações tradicionais, nenhuma previsão que autorize o MMA a dispor da área sem autorização da concessionária e do Conselho Deliberativo da UC, para finalidades não previstas no respectivo Plano de Manejo.
3. Não houve consulta prévia às populações residentes a respeito da inclusão das Resex no referido Programa, conforme prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 1989, reconhecida e em vigor no Brasil.
Causa espanto que o MMA tenha deixado de usar bilhões de reais disponíveis no Fundo Amazônia e se recusado a receber novas doações de cooperação internacional definidas em contratos com regras claras e transparentes, para recolher doações que sequer pagam a realização de um plano de manejo de uma unidade de conservação e, mais grave, sem regras claras e públicas de como esses recursos serão utilizados.
As responsabilidades do Estado com relação às unidades de conservação com populações humanas não podem ser compartilhadas com a iniciativa privada sem acordos claros de cooperação e com a participação ativa dos concessionários.
As comunidades das Reservas Extrativistas não são órfãos nem estão disponíveis para “adoção”. Os territórios onde vivem já foram adotados por seus antepassados e são cuidados como legado para as futuras gerações.
A inclusão das Resex no Programa Adote um Parque do polêmico Ministro Salles é mais uma jogada para “deixar passar a boiada” e continuar com o acelerado processo de destruição da Floresta Amazônica.
Finalmente, queremos registrar que os governos, organizações multilaterais e sobretudo as empresas “adotantes” que apoiem esta manobra para dividir as organizações e as própria comunidades tradicionais que habitam as RESEX, talvez no pior momento da pandemia e de total desassistência por parte do MMA, serão cúmplices da aceleração do processo de destruição da Floresta Amazônica com grave impacto nasmudanças climáticas.
O CNS vai recorrer à justiça, em todas as instâncias, e, em conjunto com ONGs, nacionais e internacionais aliadas, fará campanhas de esclarecimento nos países destas empresas “adotantes” para esclarecer os danos à Amazônia que provocará a descabida ideia do Ministro Salles de tratar Resex como Parques.
Rio Branco, 09 de abril de 2021
Júlio Barbosa da Aquino
Presidente do CNS