A dimensão estética da política foi tema da mesa de abertura da segunda etapa do Emergências Amazônia, que teve como foco o ativismo no design.
A pró-reitora de extensão da UFRJ, Ivana Bentes foi mediadora do debate protagonizado pela artista visual Priscila Barbosa; a multiartista Zaika dos Santos; a jornalista Carol Anchieta; a pesquisadora de comunicação política, a cubana Kalia León e a fotógrafa e designer venezuelana, Cacica Honta.
Como anfitriã, a coordenadora da Casa Ninja Amazônia, Marielle Ramires deu as boas-vindas aos presentes e ressaltou que todas as ações do Emergências têm como foco pensar o meio ambiente a partir das perspectivas dos direitos humanos.
“Precisamos pensar juntos formas de combater as desigualdades sociais. Hoje, iniciamos o debate estético”, explicou. Ritmado por diversas ações nos próximos meses, o Emergências se consolida como um grande movimento ativista que delineia suas bases em várias regiões do Brasil e América Latina, estabelecendo conexões.
Sob o viés da Justiça Climática, o Emergências preza pela pluralidade. “Vamos formar redes temáticas de feminismo, pretitude, de hackerismo… com núcleos na Amazônia, do Cerrado, Pantanal. Temos desafios em comum”, reforça Marielle ao convocar a coletividade.
Provocadas por Ivana Bentes, as participantes do debate falaram sobre a politização estética em seus trabalhos.
A fotógrafa e fundadora do projeto de comunicação política Kalia Leon, de Havana (Cuba), contou que em seu país, é um grande desafio para o comunicador pensar em design em um ambiente relativamente novo: a internet chegou ao país recentemente e o acesso ainda não é tão democratizado como se deseja.
“Devido à natureza política, os bloqueios comerciais e conflitos com os EUA e a chegada recente da internet aos celulares móveis [a partir de 2018], é desafiadora a comunicação política no ciberespaço”.
A venezuelana Cacica Honta, que é produtora audiovisual na Causa Venezuela desde 2012 e uma grande observadora do cotidiano das ruas, relata que a melhor maneira que encontrou de promover uma comunicação revolucionária foi “falar a língua do povo”.
Assim como Cacica, a ilustradora Priscila Barbosa também se dedica à força da iconografia.
Ao representar o corpo feminino, critica padrões estéticos e comportamentais vigentes, como estratégia de enfrentamento e questionamento das relações de poder. “São expressões de mulheres se reconhecendo como uma potência de revolução”.
Nessa perspectiva da política feita a partir do corpo e do cotidiano, num espectro mais amplo, Zaika traduziu a resistência no ambiente digital a partir da sua visualização como um quilombo do ciberespaço, pelo viés do afrofuturismo.
“Que precisa ser pensado também com base no afropresentismo – construção do futuro através do presente – e o africantismo – das raízes históricas. Uma dinâmica de ficção e realidade”.
Carolina Anchieta, que também é afrofuturista e mestranda em design estratégico contou sobre suas pesquisas na área. “Quando a gente para observar imagens de prospecção do futuro, que futuro é esse que não nos viu? Mataram a gente?”, ao criticar a ausência de representatividade no exercício da ficção científica.
Ela propõe o retorno ao passado para reafirmar a potência de histórias como perspectiva de futuro. “Para que não sejamos inferiorizados no presente, mulheres sexualizadas e homens marginalizados. Precisamos projetar um futuro potente”.
O afrofuturismo, enfatizam Zaika e Carol, se apresenta como uma possibilidade de projeto, um futuro inovador, em contraponto ao presente colonialista e machista.
Em um outro momento do debate, as participantes comentaram sobre os desafios de desenvolver uma iconografia revolucionária.
Observando Cuba, Kalia afirmou que há muito por fazer, principalmente no que diz respeito à representatividade feminina no contexto histórico da revolução, para que por exemplo, sejam levadas à luz, as mulheres que a protagonizaram, mas não compartilham do mesmo espaço dado aos homens.
Zaika ressaltou que há que se ampliar o raio de alcance. “Afinal, muitos dos que deveriam acessar essas discussões, vêm das populações negras e indígenas, que não dispõem de acesso integral à internet”.
Sobre o tema do conteúdo a ser explorado, a especialista em desenvolvimento estratégico, Carol Anchieta destacou que é preciso investir mais na divulgação das conquistas do povo negro. “Não podemos viver só de sofrimento. A expressividade de nossa lutas dá força”.
Por fim, Priscila destacou a necessidade de um tom conciliador e aglutinador. “Peço que não desistam do diálogo, das pessoas que têm opiniões divergentes das suas. Precisamos pensar quais ferramentas podemos utilizar para criar esse diálogo e acho que a arte se apresenta como uma grande ferramenta”.
Ao encerrar a atividade, Ivana Bentes considera um momento muito propício para esse tom pacificador, ao destacar um cenário marcado pelo “comunitarismo, com redes de apoio e solidariedade”.