Sob ameaça do novo substitutivo ao Projeto de Lei nº 3.279/2004, na iminência de ser colocado à votação, 27 organizações em defesa dos povos originários, tradicionais e do meio ambiente elaboraram um manifesto contra este que é um dos piores projetos já colocados à apreciação.

Este, visa instituir o autolicenciamento, que ganharia status de um documento de “Compromisso e Aprovação”. Com o licenciamento automático, sem a realização de estudos técnicos, o meio ambiente e povos tradicionais serão duramente impactados, com danos muitas vezes, irreversíveis.

Confira o manifesto na íntegra:

 

LICENCIAMENTO FICA!

 

As entidades abaixo assinadas vêm manifestar seu mais veemente repúdio ao novo substitutivo ao Projeto de Lei nº 3.729/2004, que visa estabelecer a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, divulgado pelo relator Deputado Neri Geller na data de ontem (10.05.2021) para votação diretamente no plenário da Câmara dos Deputados.

O Projeto, se aprovado, ainda mais sem a participação dos povos e comunidades impactados, constituirá frontal violação aos direitos constitucionais dos povos indígenas, especialmente de seus direitos territoriais.

Seu objetivo é impor severos impactos às Terras Indígenas, assim como aos Territórios Quilombolas, Unidades de Conservação e áreas de proteção, bem como ao patrimônio histórico e cultural, sem que sequer sejam objeto de avaliação de impacto ou de medidas de prevenção, mitigação e compensação.

E a consequência da devastação ambiental sobre essas Áreas Protegidas recairá sobre o direito de toda a sociedade a viver em um meio ambiente ecologicamente equilibrado, impactando a vida, a qualidade de vida, a saúde e a dignidade humana.

A proposta prevê que apenas serão consideradas no licenciamento ambiental as Terras Indígenas homologadas, o que exclui cerca de 40% das Terras em processo de demarcação.

Por igual, limita a avaliação de impactos e as medidas preventivas aos Territórios Quilombolas titulados, suprimindo 87% desses territórios do mapa, para fins de licenciamento.

Da mesma forma, há sérias restrições à aplicação da legislação sobre Unidades de Conservação e áreas de proteção ao patrimônio histórico e cultural. Ocorre que as Terras Indígenas e Territórios Quilombolas, áreas de uso coletivo, não se sujeitam à finalização dos processos de demarcação para que os direitos dos povos indígenas e quilombolas sejam considerados.

O Supremo Tribunal Federal, por inúmeras oportunidades, inclusive recentes, tem reiterado que esses direitos territoriais independem de ato estatal de demarcação ou titulação que os reconheça. As disposições contidas nos artigos 39 e 40, se aprovadas, além de patentemente inconstitucionais, demonstrarão desprezo do Congresso Nacional com a pauta de meio ambiente e de direitos humanos, na esteira da agenda de destruição do governo Bolsonaro.

Tudo isso no momento em que o País é cobrado a reforçar as salvaguardas que garantam os direitos das comunidades indígenas e quilombolas, já gravemente afetadas e vulnerabilizadas pela pandemia e pela estagnação de políticas públicas que garantam e efetivem os seus direitos territoriais.

É inadmissível que a emissão de licenças para autorizar empreendimentos com significativo impacto em Terras Indígenas e Quilombolas seja realizada sem qualquer avaliação de impactos e adoção de medidas de prevenção de danos aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, além da explícita violação ao seu direito de consulta livre, prévia e informada, fazendo de seus direitos, da Constituição da República Federativa do Brasil e de tratados internacionais assinados pelo Brasil, letra morta.

Indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais têm o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito aos seus territórios, sendo inadmissível que o projeto tente tratorar suas terras e o faça sem o mínimo de diálogo com seus povos ou sem o competente processo de consulta livre, prévia e informada, previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos, na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), no Pacto Internacional sobre Direitos Cíveis e políticos (PIDCP), Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais (PIDESC) e na Convenção para a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial. Diante da extrema gravidade do projeto e de sua patente inconstitucionalidade, registramos que não admitiremos retrocessos em nossos direitos e, com o apoio da sociedade brasileira e também da comunidade internacional, tomaremos todas as medidas cabíveis para impedir a aprovação do PL nº 3.729/2004, cujas consequências podem causar o extermínio físico e cultural de povos indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais brasileiras.

REFORÇAMOS QUE NOSSA LUTA É POR NENHUM DIREITO A MENOS E NENHUM PASSO ATRÁS!

 

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ

Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS

Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME

Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste – ARPINSUDESTE

Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul – ARPINSUL

Aty Guassu Guarani Kayowá

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB

Comissão Guarani Yvyrupa – CGY

Conselho do Povo Terena

Instituto Socioambiental – ISA

Indigenistas Associados – INA

Conselho Indigenista Missionário – CIMI

Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato – OPI

Centro de Trabalho Indigenista – CTI

Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB

Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN

Operação Amazônia Nativa – OPAN

Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – IEPÉ

Rede de Cooperação Amazônica – RCA

Greenpeace Brasil

Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO

Fundación Arayara de Educación y Cultura

Observatório do Carvão Mineral

Observatório do Petróleo e Gás

Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida – COESUS

Observatorio de direitos e políticas indigenistas – OBIND