Com preço do manganês nas alturas, ilegalidade ameaça território Kayapó (Carol Quintanilha-ISA)

 

Depois do ouro, a nova corrida de exploradores ilegais é pelo manganês. Uma alta demanda da China e preço internacional nas alturas aumentou a procura pelo metal.

Por concentrar as melhores jazidas do mundo, o território Kayapó, no Sudoeste do Pará, é novo alvo de cobiça. Conforme alerta do projeto Amazônia Minada – que monitora a incidência de requerimentos minerários em terras indígenas (TIs) – o minério que correspondia a pouco mais de 1% dos requerimentos para exploração em terras indígenas, agora aparece em segundo lugar.

Enquanto o ouro é o mais procurado, representando 66,7% dos pedidos, o manganês teve um salto na demanda, representando mais de 15% das intenções de exploração. Na sequência, figuram a cassiterita (8%) tântalo (4,4%) areia (2,2%), diamante (2,2%), cobre (0,7%) e ferro, 0,7%.

Há anos os Kayapó vêm denunciando a situação, inclusive à omissa Funai. Eles relatam sinais como tremores e poeira que sobe quando mineradoras usam explosivos para detonar rochas de manganês no entorno das aldeias. Eles também flagram a movimentação de caminhões lotados com o minério. Dentro de suas terras, ainda que seja proibida a extração, eles detectam rastros de invasores, como buracos deixados por eles à procura do minério.

A própria Agência Nacional de Mineração (ANM) confirma apreensões de cargas ilegais em barreiras no interior do Pará.

A propósito, a região onde vivem os Kayapós, abriga também a famosa província mineral de Carajás, uma localidade geologicamente privilegiada que oferece ao mundo ouro, cobre, ferro e manganês de qualidade excepcionais. E por esse mesmo motivo é um barril de pólvora, propícia a conflitos motivados pela disputa da terra. Depois do povo Kayapó, são os Yanomami os mais atingidos por solicitações de exploração do manganês.

Você deve se perguntar por qual motivo empresas estariam tentando emplacar autorizações para lavras em terras indígenas se são proibidas, mas eles não se cansam de tentar. O PL 191/2020, apresentado por Jair Bolsonaro com o firme propósito de liberar a mineração dentro de terras indígenas dá esperança a invasores que já ousam atuar na ilegalidade.

No ano passado foram feitas à ANM, 38 solicitações para explorar manganês, mas até junho de 2021, 17 foram indeferidos. Outros dois reformularam suas áreas e agora são “vizinhos” das aldeias. O indeferimento se dá por orientação do Ministério Público Federal por se tratar de exploração sobreposta a terras indígenas. Considerada prática ilegal. A ANM diz que não pode rejeitar os pedidos, apenas negá-los.

Segundo a reportagem do InfoAmazônia, 16 dos 17 pedidos  protocolados em 2020 e indeferidos pela ANM foram feitos em nome de uma mesma empresa, a Patium Beneficiamento de Minério e incidiam diretamente sobre a TI Kayapó. Além das requisições derrubadas, a Patium mantém ativas outras 17 solicitações para extrair manganês sobrepostas às TIs Kayapó (11), Badjonkore (3) e Las Casas (3) – todas do povo Kayapó.

Mas, “embora a ANM garanta que ‘não concede alvarás ou qualquer permissão em terra indígena’ e que ‘pode haver requerimento, porém não prosperará após análise’, duas solicitações protocoladas em 2017 incidentes sobre a TI Las Casas tiveram autorização de pesquisa emitida – contrariando frontalmente o que a agência disse à reportagem. Uma delas é de exploração de manganês, a outra, de cobre”.

Segundo o levantamento da Amazônia Minada, projeto especial do InfoAmazônia, entre os 53 pedidos para minerar manganês em terras indígenas levantados pelo projeto Amazônia Minada, oito tiveram título de pesquisa emitidos pela ANM – contrariando a afirmação da agência, de que não autoriza exploração mineral em áreas demarcadas. Afinal, nessa etapa do processo, já é permitida a extração de amostras dos minérios ainda que apenas para pesquisa.

Um desses pedidos com autorização de pesquisa emitida pode representar o acirramento de um conflito entre os indígenas Xikrin, uma das subdivisões do povo Kayapó de acordo com o Instituto Socioambiental, e a companhia Vale S.A. A reportagem ressalta que o pedido teve andamento mais de 30 anos após ser protocolado.

A exploração dessa jazida de manganês incidente sobre a TI Xikrin do Cateté que está em nome da Vale pode agravar a condição de saúde dos habitantes da terra indígena. Segundo o pesquisador da Universidade Federal do Pará, Reginaldo Sabóia, que mediu a presença de metais pesados em amostras de cabelos dos indígenas, eles correm perigo. “Apresentaram um índice de contaminação por manganês de impressionar qualquer profissional com conhecimento de caso”, atesta Sabóia em um relatório de fevereiro do ano passado.

Segundo uma pesquisa conduzida pela Fiocruz, a ação tóxica do manganês se revela imediatamente nos pulmões e no sistema nervoso central, “levando a manifestações clínicas, predominantemente, de esfera neurológica e à inflamação do trato respiratório superior”.

Confira mais detalhes:

Demanda internacional por manganês ameaça indígenas Kayapó no sudeste do Pará