Foto: Fábio Nascimento/Fotos Públicas

A crescente dependência da Europa por carne bovina brasileira gerou 20,8 milhões de toneladas de emissões de gases do efeito estufa (GEE) no Brasil, só em 2019. A Amazônia, o Pantanal e o Cerrado foram os biomas com maior taxa de emissão, de acordo com o uma investigação da Earthsight, ONG com sede em Londres (UK).

O relatório foi divulgado no início de setembro e revela as pegadas destrutivas do desmatamento aliado a ampliação de áreas de pasto para criação de gado, que teve alta recorde em 2019. O relatório aponta que a agropecuária pode ter sido responsável por 34% do desmatamento nesse mesmo ano. A investigação também utilizou estudos do Instituto Escolhas e do Mapbiomas.

Embora as emissões globais de GEE devam cair este ano devido à pandemia de covid-19, o Brasil deve contradizer essa tendência e ver um aumento entre 10 e 20 por cento. O desmatamento responde por quase metade das emissões totais de GEE do Brasil, com a agricultura e pecuária representando mais de um quarto do total.

Para se ter uma ideia, um quilo de carne com origem na Europa emite 22kg de GEE por quilo de carne, já no Brasil a quantidade de GEE emitido em cada quilo salta pra 78kg, ultrapassando 100kg em estados com bioma Amazônico ou do Cerrado.

Mato Grosso líder em venda de carne para a Europa e 1º lugar em emissão de CO2

Quase toda a carne bovina (96 por cento) enviada para a Europa veio de instalações em apenas cinco estados: Mato Grosso, São Paulo, Rio Grande do Sul, Goiás e Mato Grosso do Sul, aponta a Earthsight.

Os cinco principais países de destino da carne bovina desses cinco estados são: Itália (29.650 toneladas), Reino Unido (28.030 toneladas), Holanda (22.084 toneladas), Espanha (9.466 toneladas) e Alemanha (8.060 toneladas).

O estado que lidera as vendas de carne para a Europa é o Mato Grosso, com 33%. Lar da Amazônia, Cerrado e Pantanal, MT também lidera as taxas de desmatamento na jornada histórica desde 2017. O Estado também está pouco à frente de Rondônia em áreas desmatadas para criação de gado na linha histórica desde 2010. Para se ter uma ideia, um quilo de carne bovina produzida em Mato Grosso a partir de gado criado em pastagens degradadas associadas ao desmatamento gera a impressionante quantidade de 1.695 kg CO2e.

A investigação da Earthsight aponta que as importações para a Itália tiveram o maior rastro de carbono, variando de 244.440 a 1,1 milhão de tCO2e. A Itália é seguida de forma diversa pela Holanda, Espanha, Alemanha e Reino Unido, dependendo do modelo de produção aplicado.

JBS e Silca na mira do rastro do desmatamento

As emissões de GEE estimadas estão dramaticamente concentradas nas importações de poucas empresas, revelou a Earthsight. Apenas duas gigantes dos alimentos: Silca e JBS, respondem por quase um quarto das emissões estimadas. Oito empresas são responsáveis ​​por mais da metade e 27 empresas respondem por 80%, de acordo com o relatório.

“Quando calculada usando as emissões médias superiores em nível estadual, a empresa italiana Silca tem uma pegada maior (375.000 tCO2e) do que a Alemanha (224.623 tCO2e) ou o Reino Unido (152.294 tCO2e). O grupo brasileiro JBS (221.538 tCO2e), o conglomerado alemão de alimentos Tonnies (199.411 tCO2e) e a empresa italiana Bervini Primo (181.660 tCO2e) também têm emissões embutidas mais altas do que o Reino Unido”, diz trecho da investigação.

No entanto, quando calculada com base em toda a carne importada proveniente de gado criado em pastagens estáveis ​​associadas ao desmatamento, a quantidade de carbono estimada de empresas individuais aumenta consideravelmente. Com essa medida, as emissões de carbono da JBS quase triplicam, colocando a empresa acima da Silca como a importadora com a maior rastro de desmatamento se compara a sua emissão de CO2.

Da mesma forma, se as importações de Mato Grosso da JBS também fossem todas derivadas de pastagens degradadas ligadas ao desmatamento, suas importações para a Europa incorporariam emissões 22 vezes maiores (5 milhões de tCO2e).

Os números colocam em xeque o avanço do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul, que busca derrubar barreiras tarifárias e aumentar a troca de produtos entre os blocos. A expansão de pasto para o gado está intimamente ligada a essa sinalização de mercado, sendo o Brasil o maior produtor de carnes do mundo alternando o podium com a China e os Estados Unidos.

“Essas descobertas ressaltam a necessidade urgente de os líderes europeus aprovarem uma legislação de devida diligência na cadeia de suprimentos. Os importadores devem ser forçados a saber a origem de seus produtos e excluir aqueles associados à perda de florestas e outros abusos”, explica Saw Lawson, diretor da Earthsight e um dos coordenadores da investigação.