Os Kawahiva são um dos povos cujos territórios estão sob uma portaria de restrição de uso. Esta é uma imagem feita pela FUNAI durante um encontro esporádico. © FUNAI

Por Priscilla Oliveira

Em mais um ataque de seu projeto genocida, o governo Bolsonaro está querendo abrir e explorar terras de povos indígenas isolados. Para isso, eles pretendem acabar com portarias de restrições de uso que atualmente protegem terras indígenas de povos isolados que ainda não foram demarcadas. Esse ato colocaria esses povos em um perigo ainda maior de extermínio.

Desde a publicação do Decreto n° 1775 de 1996, esse regulamento, chamado de restrição de uso, é usado para proteger essas terras indígenas da invasão e exploração ilegal.

Atualmente, existem sete terras de povos indígenas isolados que estão sob restrições de uso. A maioria dessas restrições precisa ser renovada, em média, a cada três anos. Três delas vencem este ano – das terras indígenas Piripkura (MT), Jacareúba/Katawixi (AM) e Pirititi (RR) – e a de Ituna Itatá que vence em janeiro de 2022.

Os indígenas isolados dessas quatro terras, em especial a TI Piripkura e a TI Ituna Itatá, estão em uma situação extremamente vulnerável e já sofrem intensa pressão de grileiros e de outros invasores.

Na Terra Indígena Piripkura, apenas três sobreviventes de massacres que ocorreram antes da restrição de uso são conhecidos. Porém estudos indicam que possa haver outros sobreviventes. A TI Piripkura está entre as mais desmatadas de 2020 entre os territórios com presença de povos indígenas isolados.

Baita e Tamandua, dois homens Piripkura que estão entre os últimos sobreviventes de seu povo. Seu território está sob uma restrição de uso, mas corre o risco iminente de ser completamente destruído por madeireiros e grileiros. © Bruno Jorge

A situação da Terra Indígena Ituna Itatá (PA) é também particularmente crítica. Esse foi o território mais desmatado do Brasil em 2019, e a destruição continuou no último ano. A pressão política sobre essa terra é intensa.

Um dos responsáveis por essa pressão é o senador Zequinha Marinho do PSC (Partido Social Cristão) que está em campanha para reduzir a TI Ituna Itatá e abri-la para grileiros, madeireiros e fazendeiros. Ele tem fortes ligações com o lobby da mineração, pecuária e com esquemas de grilagem de terras, e tem repetidamente negado a existência de indígenas isolados na região. A presença de grupos isolados é conhecida pela FUNAI desde a década de 80, e há extenso material comprovando a existência de indígenas isolados em Ituna Itatá, inclusive de expedições da Funai em 2009.

Além disso, existe um despacho de 2020 assinado pelo então Diretor de Proteção Territorial da FUNAI, Alexandre Silveira de Oliveira, orientando que a Terra Indígena Ituna Itatá seja reduzida de tamanho. Até mesmo mapas da FUNAI com propostas extra-oficiais de redução da TI foram elaborados.

Além do desmatamento, outra grande ameaça são fazendeiros e grileiros que estão registrando parte dessas terras como propriedades particulares utilizando o Cadastro Ambiental Rural (CAR). Esses registros estão diretamente ligados as frentes de desmatamento e exploração ilegal nessas áreas.

O boletim Sirad-Isolados do Instituto Socioambiental de fevereiro deste ano mostrou que as terras indígenas que mais possuem CAR ilegais em seus territórios são as que estão sob restrições de uso – na Terra Indígena Pirititi os CARs que sobrepõem parte do território ocupam mais de 19mil hectares, ou 47% do território. A TI Piripkura também apresenta alta presença de CARs: são 29 registros que sobrepõem parte do território ocupando 20% de toda a terra indígena. Outras duas terras sob restrições de uso que possuem alta incidência de CARs são a TI Kawahiva, onde ocupam mais de 29% do território, e a TI Tanaru, ocupando 38% do território.

O regulamento da restrição de uso também já foi atacado publicamente pelo presidente da FUNAI. Em entrevista para o Valor Econômico, ele questionou as restrições de uso e disse que pretende revisá-las.

COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), o OPI (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato) e a Survival estão expondo a situação e pressionando o governo para renovar as restrições de uso, expulsar todos os invasores e finalizar os processos de demarcação desses territórios.

Angela Kaxuyana, da Coordenação Executiva da COIAB, afirmou: “Chega de massacres! Não permitiremos mais invasões! É muito importante a mobilização dos povos e organizações indígenas da Amazônia, e de toda a sociedade civil, para impedir que os territórios onde vivem os povos indígenas isolados sejam entregues para a exploração de madeireiros, ruralistas, garimpeiros e outros predadores de floresta. Se o governo Bolsonaro acabar com as Restrições de Uso, será mais um desastre e atentado contra a vida desses povos, que faz parte do grande plano de desmonte da política indigenista no nosso país. Precisamos evitar que mais vidas sejam perdidas nesse (des)governo, estamos vigilantes para continuar na defesa dos nossos direitos a vida, e dos nossos parentes que vivem nos seus territórios de forma autônoma”.

As restrições de uso são atualmente o único regulamento que separa esses povos indígenas isolados do extermínio. O plano dos ruralistas e de políticos para acabar com as restrições, roubar essas terras e exterminar os indígenas isolados que ali vivem é mais uma etapa da guerra do governo Bolsonaro contra os povos indígenas do Brasil. Precisamos pará-lo agora.
Você também pode ajudar: envie um email para o governo brasileiro pedindo que renovem as restrições de uso. E pressione também nas redes sociais: procure e use #AssinaFUNAI!